domingo, 30 de setembro de 2012

Crônicas fotográficas_1


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Casas Paulistanas_Iatã Cannabrava*


O título da postagem tem a ver com a oficina de fotografia de que participei.
Eu vou contar um pouco por que fui fazer essa oficina.
Quem visita o blog há algum tempo sabe que uso câmera de filme, mais conhecida por analógica, e de algumas coisas mais que passo nesta era digital. Chega a ser uma verdadeira operação de resistência fazer isso, sobretudo no Brasil onde as dificuldades em encontrar materiais é uma constante.
O que se pensa sobre câmeras analógicas e digitais está muitas vezes cheio de equívocos. Soube de uma pessoa que ouviu de professor uma fala preconceituosa pelo fato de ela usar câmera de filme. Tive um colega na oficina de fotografia P&B que fiz no Museu Lasar Segall que, antes mesmo do término da oficina, já estava vendendo os filmes porque havia encomendado uma câmera digital,
como se os dois tipos de câmera não pudessem conviver embora ambas serem equipamentos fotográficos. Propôs também a venda dos filmes Kodak Tri-X e dos papéis fotográficos, específicos para a ampliação das fotografias em P&B, vaticinando o fim desse tipo de fotografia.
Um dos motivos, não exatamente o principal, para me interessar pela oficina foi a aceitação de câmera analógica. Sem isso,  eu não poderia participar de antemão.
Não digo que não haja complicações para essa convivência num curso em que a maioria das pessoas usa as digitais. Com câmeras digitais fotografa-se o número de fotografias Tem menos limitações, afinal há a memória da câmera e também os cartões de memória. Eu tenho, em princípio, de usar as 36 poses do filme antes de mandar revelar.1
Sim, tenho de levar em conta a questão do custo do filme, da revelação. Não vou desperdiçar poses só para ver as fotos feitas por causa da oficina, então toca fotografar até o que não me interessa muito para “gastar” o filme.2
Ao contrário de mim, os outros colegas podem ver suas fotos imediatamente no visor da câmera digital ou na tela do computador.
Há lugares em que revelam rápido o filme, mas quero qualidade e prefiro dar um tempo maior. Penso sempre que posso ter feito uma bela foto e não quero meu filme manuseado de modo inadequado.
Já passei por um problema em que, numa dessas revelações rápidas, apareceu uma imagem fantasma no negativo e, por mais explicações que tenham me dado e as insinuações de erro meu,



Sem ttulo_MargaLedora2010
sei que foi causado na revelação. Entre outros motivos, porque essa imagem sobreposta que aparece no céu

Detalhe_MargaLedora2010
teria de ter sido feita por dupla exposição, o que tecnicamente eu não saberia fazer e não é simples,3  e o pior não é isso, sinceramente não reconheço essa cena-fantasma no céu de minha fotografia, Há um ventilador no ambiente, há uma luminária, nunca vi essa cena. Teria de ter parado de fotografar e ir para esse lugar, coisa que não aconteceu. A fotografia seguinte foi feita poucos minutos depois com a câmera voltada para o mesmo céu, algo houve no laboratório. Não sei ainda o que pode ter sido. Não precisaria dizer, mas não revelo mais filme na tal loja.

O que facilita muito minha vida é usar o recurso de digitalização do filme e ter as fotos salvas em CD ou pendrive, não havendo a obrigatoriedade de fazer ampliação das fotografias em papel como antigamente. Isso é maravilhoso, faz com que haja mais um motivo para continuar usando filme. O que estou dizendo é que, com o escâner de filmes fotográficos, tem-se a tecnologia a serviço da fotografia analógica. Não sei por que insistem em diminuir e desejar o fim desse tipo de câmera se as analógicas continuam sendo maravilhosos instrumentos para fazer fotografia.
Alguns já sabemos que é possível fazer fotografias fantásticas com uma pinhole, feita com uma simples caixa de sapatos, bastando fazer nela um pequeno orifício, cobri-lo com uma lingueta feita com um pedaço de fita isolante e, em lugar totalmente escuro ou com luz adequada,4 colocar um pedaço de papel fotográfico no fundo dessa caixa e vedar bem. O procedimento básico da pinhole de abrir o orifício e expor o papel fotográfico à luz por alguns segundos é  o mesmo que ocorre também nas  câmeras de filme e nas digitais, só que a fotografia numa fica registrada no no filme e na outra no sensor.5
O fator ver imediatamente a foto tem lá seu peso. Entrei num leve desespero por não poder ver logo o resultado da primeira saída fotográfica que fizemos. Foi num dia nublado, levei apenas a lente zoom, que tem umas limitações de abertura em cena com pouca luz. Bobeei em não carregar na bolsa a fixa de 50 mm, que quanto a isso tem mais possibilidades. Cheguei à praça do Centro de Convivência sem ter ideia do que faria ali, há muito tempo não fazia fotografia externa…
E até agora não expliquei do que se trata a oficina para vocês entenderem a saída e, principalmente o motivo de eu participar, que já mencionei não ser só o fato de aceitação de câmera analógica.
Crônicas Fotográficas foi uma oficina sobre ensaio fotográfico, como as fotografias de Iatã Cannabrava, mostradas no início do texto, que estão no ensaio Casas Paulistanas
.
É, ensaio tem isso de ser um conjunto de fotografias relacionadas umas com as outras, com fotos que às vezes passam a fazer um sentido bem diferente se vistas em separado, fora do grupo, fora da sequência em que aparecem seja na exposição ou num livro.
Na hora em que Paulo [Baliéllo], o coordenador da oficina, falava, descrevia a expressão “ensaio fotográfico”, me veio a comparação das fotos com palavras numa frase, porque é na frase que o significado de cada uma delas se define, é em relação umas com as outras que se dá o significado da frase. Isso é o meu modo de falar do que Ferdinand de Sausurre, linguísta, disse sobre a relação das palavras na frase. E eu usei porque Paulo fala que num ensaio desses conta-se uma história através das fotos. Sou graduada em linguística, me veio naturalmente a analogia entre palavras, numa frase, e fotografias, num ensaio fotográfico.
Digo ainda que no ensaio elas formam uma espécie de texto. 
Fotos, na verdade imagens, sejam elas pinturas, desenhos, esculturas, arte em geral, fotografias, que felizmente passaram a entender como arte, toda
s podem ser lidas. Os elementos nela, às vezes mesmo sem saber da situação em que foi feita, nos permitem olhar e falar sobre o que se vê, também sobre possíveis intenções do fotógrafo ao fotografar a cena, objeto ou pessoa. Por exemplo, o recurso de desfocar, esse recurso pode ser usado no fundo da cena ou na frente, dependendo do que nessa cena quem faz a foto está interessado que vejamos ou não,


como dá para ver em Espelhar acima. Foto em que decidi dar destaque para os objetos na cena que eram refletidos no espelho, desfocando o relógio que estava mais perto da câmera, de mim.
Podemos fotografar já com um tema na cabeça. Na verdade tinha um tema antes da saída, pensei nos postes de iluminação, algo assim, nada muito definido pois achei que tinha de ver as condições do local. No entanto, chegando lá, me deparei com situações que me levaram para um tema mais antigo dentro de mim. Foi inesperado, passo constantemente pela praça e jamais havia pensado em fotografar ali, nada me atraía para aquele lugar com ideias para fotografar menos ainda.

Ensaio é um conjunto de fotos com algum tipo de ligação, lembro de Vera [Albuquerque], fotógrafa profissional e coordenadora da oficina Fotografia Criativa do Museu Lasar Segall (SP), falar em buscar fotografar com base em literatura, poemas, objetos de um cor escolhida previamente etc. A decisão é bem pessoal, podemos fotografar casas num único bairro, entre outros temas, como crianças, gatos, os temas são infinitos. As fotos devem perseguir esse fio condutor que é o tema. Alguns fotógrafos fazem ensaios com material fotografado ao longo da vida quando percebem que fizeram fotos sobre o mesmo assunto e, analisando, perceberam que elas conversavam, formando um conjunto.
Creio que o ensaio não seja sempre pensado de antemão ou que seja necessário ficar fotografando o tempo todo em função do tema para chegar a um ensaio. O elo também pode não ser o mesmo assunto. O que encontramos no caminho também pode nos dar um tema, o que aconteceu comigo de certa forma.
Vou voltar a falar de ensaio fotográfico mais um pouco depois, fico escrevendo e lembrando disso e daquilo noto que não vai caber num único texto.
Decidido o tema, feitas fotos, muitas, passar à escolha das fotos, a seleção.
Na primeira saída, fotografei pouco, como disse o dia nublado, a lente zoom, a pouca luz… não relaxei nem quando a colega Kellen, que é fotógrafa, me disse que era bom por causa da luz difusa.6
Enquanto meus colegas faziam fotos a todo momento, eu não! Costumo pensar muito a fotografia. Eu me demoro olhando, enquadrando, ajeitando o tripé, decidindo o tempo de exposição, a abertura do diafragma,7  o melhor ângulo para captar a cena, o que nela é importante para mim. Tenho um comportamento de quem fotografa em estúdio, faz retrato, situação em que dá para controlar melhor o fazer fotografia, o tempo pode ser maior. Mas ali não foi diferente. Não estava registrando objetos em movimento, tinha de me preocupar com a quantidade de luz nas cenas, a tarde se tornando noite.
Não foi uma sessão tranquila, estava muito insegura por ter de fazer boas fotografias com a finalidade de ser vista por outras pessoas, por Paulo, e tinha feito poucas com sei lá que qualidade.
Revelado e escaneado o filme na loja, em casa algumas já foram descartadas por mim assim que vi. Mas levei umas rejeitadas para conferir com ajuda de todos. Salvaram-se umas cinco, depois que expliquei qual seria meu tema e verificamos quais mostravam melhor minha ideia. O objetivo era de que cada um de nós tivesse nove fotos para a exposição de encerramento da oficina.
Algo que Paulo costuma dizer é que mesmo fotógrafos experientes fazem fotos ruins, por isso a seleção das melhores é essencial para todo fotógrafo e, no caso de ensaio, a seleção mesmo dentro das melhores é o que vai definir o caráter do conjunto, do ensaio, assim vão entrar as que mais bem tratam do tema escolhido e que têm uma ligação no que diz respeito do que é e como é mostrado. Então olhar todas as fotos na primeira seleção impressas no papel8 sobre uma mesa é um passo importante para ir aproximando as que conversam numa ponta da mesa, as que ficam mais ou menos adequadas no conjunto e as que não vão entrar mesmo.
Bem, por hoje é o que tenho para contar sobre a oficina, já me alonguei bastante. Tenho de verificar o que mais pode, deve ser dito sobre ensaio fotográfico e falar do meu ensaio.
Neste texto mantive fatos sobre a primeira saída fotográfica, logo volto com a segunda saída e talvez já conte como foi o final, com a escolha das nove fotografias.
Para não haver reclamações aqui está uma das minhas favoritas do ensaio



Esta é da primeira saída e ficou decidido que ela entraria no ensaio logo de cara por mim e com a concordância de todos, mesmo de Paulo.
Ela foi feita depois de eu arranjar o tripé para poder fazer o enquadramento de tudo que me daria uma foto que mostrasse a melhor composição de elementos e desse destaque à planta, mesmo ela sendo um elemento de pequena dimensão na cena, em comparação com a escada, com a parede. Ao fotografar temos de encontrar o ângulo mais adequado. Aqui peguei a cena num enquadramento frontal, para isso tive de deixar as pernas do tripé com alturas diferentes por não haver um local plano para instalá-lo.
Na verdade duas pernas ficaram numa canaleta e a outra sobre o calçamento da praça.
Fotografia e luz, com o céu nublado, a quantidade de luz já é menor. Fotografando externamente a questão da luz é especial, muda muito rapidamente. Fomos para a praça, acho que pouco antes das três horas da tarde.
O dia foi entardecendo, a noite à espreita. 

_______
* Quero deixar bem claro que minha intenção, ao compartilhar as fotografias de Iatã Cannabrava, é apenas de ilustrar a postagem com fotografias de qualidade e fazer mais pessoas conhecerem a obra do fotógrafo.
Não me passa pela cabeça me promover à custa do artista, acho importante falar de um assunto com bons exemplos para melhor informar.
Não tenho a autorização do fotógrafo, mas não estou agindo de má-fé, e obviamente, caso haja discordância dele em relação à permanência delas no meu blog, suas fotografias serão imediatamente retiradas daqui!

1. Não tenho encontrado rolos com menos poses, vivo sonhando com rolos de 12 poses para testar algumas técnicas, possibilidades da câmera e meu desempenho como fotógrafa.
2. Na verdade a outra opção é a de não fazer qualquer fotografia para dar cabo das poses. Não sou a favor de fazer como quem usa as digitais, fotografam sem parar e o resultado não é lá essas coisas, prefiro fazer poucas fotos mas com o critério de qualidade, de imagem significativa em mente.
3. Para fazer foto com exposição dupla, teria de voltar um pouco o filme e a câmera profissional não facilita essa operação,  que teria de ser consciente da minha parte por ser necessário girar uma pecinha nela. A câmera que uso não me permite fotografar duas vezes sem avançar o filme.
4. O papel fotográfico usado é do tipo ortocromático, portanto se exposto à luz comum, reage imediatamente. Só podemos manuseá-lo em ambiente com luz vermelha ou laranja. Quando digo que ele reage é que registra a luz em toda a superfície, não pode mais ser usado. Ao ser revelado, com produtos químicos, o que se vê é o papel todo preto, sem nenhuma imagem, pois foi superexposto à luz. Colocado na pinhole o papel, fechada a pinhole, vamos fotografar uma cena levantando a lingueta de fita isolante por alguns segundos para que a imagem que enquadramos seja registrada no papel e fechamos o buraco muito bem para abrir a pinhole apenas no laboratório com a mesma luz vermelha e revelar.
5. “O sensor fica na sua câmera digital no mesmo lugar onde ficava o filme na câmera analógica. Quando você tirava uma foto o filme rodava e ia para a próxima pose. O sensor não ‘roda’, ele manda a foto para o processador da câmera que manda para o cartão de memória, assim sua câmera fica pronta para a próxima ‘pose’.”
Mais informações sobre sensores em http://www.dicasdefotografia.com.br/fotografia-digital-o-que-e-sensor
6. Vejam informações sobre luz difusa e outros assuntos ligados à luz para fotografar aqui
http://www.univ-ab.pt/~bidarra/hyperscapes/video-grafias-228.htm
7. Diafragma fica no miolo da lente, é móvel, regulado pelo fotógrafo


Fonte da ilustração
http://adrenaline.uol.com.br/forum/cameras-digitais-filmadoras-e-tecnicas-relacionadas/237604-minituto-saiba-como-usar-abertura-do.html
8. Podemos olhar as fotos no monitor, na tela do notebook, mas nada como ver como ficam no papel, desse modo não enfrentamos problemas de resolução, de limitações do monitor quanto às cores e, afinal, as fotos vão ser vistas numa exposição, vão ser impressas com formatos maiores do que se pode ver no monitor. Existe a possibilidade de imprimir em papéis fineart e não meramente nos papéis comuns!
Ver uma foto ao lado da outra também faz uma diferença grande, nesta situação podemos decidir a ordem em que vão ser expostas, não só as que vão ser descartadas.

ML_ A postagem ficou enorme...
Bem, quero acrescentar sobre ter usado fotos de Iatã Cannabrava aqui. Tinha visto reproduções de suas obras durante a oficina de Paulo e gostei tanto que em casa procurei por mais fotos. No blog procuro trazer o que mais me agrada, o que é importa não só para mim mas talvez para mais pessoas!
Agora é claro que o fotógrafo Cannabrava não precisa de minha divulgação!
Ele tem um belo trabalho e é reconhecido! O que faço é bem pequeno, mas com alegria por poder compartilhar fotos dele com vocês!