quinta-feira, 30 de junho de 2011

Luz no escuro*


Não sei se alguém vai se lembrar da primeira postagem em que me referi à câmera fotográfica Olympus TRIP 35

Pois bem, na época eu não havia sequer testado a câmera descoberta entre os guardados de meu falecido pai.
Testar era necessário para ver se ela ainda funcionava, fosse o que fosse que isso significasse. O teste foi no ano passado, quando, muito ansiosa, mandei revelar o filme que havia colocado na câmera e tinha até receio disso por temer não ver foto alguma caso houvesse problemas sérios com a câmera, de um tipo que não desse para solucionar a contento.
As fotos foram feitas no modo manual, ou seja, eu a decidir as aberturas com que faria cada foto, ainda sem noção do funcionamento de uma câmera fotográfica de verdade. Fui com a ideia de leiga sobre luz e essas aberturas, fotografando cenas iluminadas com uma abertura menor e mais escuras com as maiores.
Numa conversa com meu irmão fui surpreendida com a informação de que, quanto maior o número que consta do anel, menor a abertura para a entrada de luz pela lente da câmera


Detalhe do anel_Olympus TRIP 35_Manual original

Exato, fiz tudo ao contrário, não adiantou usar de lógica. Há uma boa resposta para a numeração aparentemente não corresponder ao tamanho que se imagina, porém é meio complicada, chegaram-se aos números fazendo cálculos. Não é o caso aqui falar sobre isso em detalhe, basta olhar essas figuras e não ter mais dúvidas, é o contrário do senso comum sobre as coisas 

Aberturas de diafragma 1Aberturas de diafragma 2Aberturas de diafragma 

Para a TRIP, o número f2.8 (no anel de cor clara) é o de abertura máxima dessa lente de 40mm; a f22, essa é que é a menor. Numa cena muito iluminada usam-se aberturas menores, como a média f5.6 ou uma menor como a f16. Para cenas mais escuras, abre-se mais o diafragma, talvez a f2.8 mesmo ou outra1.
Outra informação que tive, enquanto fotografava, foi que o fotômetro2 dela não estava funcionando. Trata-se de um fotômetro de células de selênio, células essas que não podem ficar permanentemente em contato com a luz, do contrário elas morrem. Como a TRIP havia ficado não faço ideia quanto tempo guardada em sua bolsa e esta ainda protegida por uma caixa de isopor e uma espécie de sobrecapa de papel no fundo de uma gaveta, foi decepcionante perceber que ela não mostrava sinais de reconhecer a luz ou sua ausência.
Soube desse fato ao encontrar na internet a informação sobre o funcionamento do fotômetro da câmera. Aliás, no começo, foi em sites que aprendi muita coisa sobre ela; não sabia que tinha fotômetro ou o que era isso.  Meu recente aprendizado de fotografia ainda estava em início e a atenção voltada para a Canon AE-1 PROGRAM, que tem recursos mais modernos e seria a usada na oficina de fotografia no Museu Lasar Segall.

Existe uma lingueta vermelha que aparece no visor da câmera, 

Lingueta_visor da Olympus TRIP 35_foto do Manual original

A quantidade de luz que passa pela lente não sendo suficiente para uma fotografia minimamente boa, ao acionar o botão disparador, a lingueta aparece e não conseguimos fotografar. Na minha TRIP, mesmo com a tampa, ou seja, sem luz nenhuma entrando pela lente, nada de lingueta vermelha.
Não pensem que entendi isso de lingueta aparecer logo de cara, demorei. Foi só depois de ver fotos da dita cuja e reler as informações como a de que o teste da luminosidade tem de ser feito com a câmera no modo automático (A)3 para dar certo. Claro que não precisava dizer que fiquei aborrecida demais, o teste era desanimador! 

No entanto, existe um consolo: pode-se fotografar sem o fotômetro interno com qualquer câmera dessas que tenham ajustes manuais de abertura de diafragma e distância do objeto, felizmente há os de mão


e, ainda sem um, na embalagem de filme fotográfico vem uma tabela que guia a gente para decidir as aberturas do diafragma controlando assim a quantidade de luz de acordo com as cenas estarem mais ou menos iluminadas

Lingueta de embalagem de Fuijifilm Fujicolor 100

E para ser sincera, depois de ver fotos feitas com essa câmera na internet, não seria um fotômetro com células mortas4 o que me faria deixá-la de lado. Ao descobrir a TRIP, não foi de imediato que quis fotografar, isso foi em 2006. Em 2010, com o desejo de levar à sério a antiga vontade de fotografar e a possibilidade de fazer a oficina de fotografia, é que fui rever a câmera e me nasceu a determinação de fazê-la voltar à ativa. É uma grande câmera.
Dada a importância de vê-la funcionar, ficava tensa, sem coragem, demorei muito a mandar revelar o filme. Quando fui à loja,  pedi para revelarem o filme sem fazer a impressão no papel, se ficassem ruins não teria de gastar muito. Revelado, vim para casa analisar o filme contra a luz e, vou parar com o mistério, escolhi duas poses 

Olympus TRIP 35_teste1_MargaLedora 2010 
Olympus TRIP 35_teste2_MargaLedora

Eu simplesmente me emocionei com elas, não porque perfeitas5, não o são, e sim por serem as primeiras depois de décadas sem que passasse nenhum raiozinho de luz pela lente dessa Olympus TRIP 35. Havia um excesso de luz  tanto numa cena quanto na outra, observável em ambas, atribuído inicialmente apenas à minha  inabilidade com o diafragma. O importante é que me fez não pensar mais para levá-la a um técnico.
Vejam como é bom contar o que aconteceu pois, ao escrever isso, acabei me lembrando que notei o diafragma travado, problema que foi confirmado numa loja de artigos fotográficos; na verdade em duas, só que na primeira eu não entendi do que se falava6 e o preço do conserto... Bastava tentar regular as aberturas girando o anel do diafragma para ver que não se alterava sua abertura7.
Fui informada, depois da avaliação do técnico, que, se eu concordasse em fazer o que me propunha, a TRIP ficaria como nova. Primeiro dúvida: nova? Umas perguntas que fiz foram respondidas e decidi confiar. Concordei. Seriam feitas a limpeza e a lubrificação das peças. Tinha certeza de que o diafragma seria destravado com esses procedimentos, mas e o fotômetro?
Só sosseguei quando, um mês depois nas mãos do técnico, me dirigi à loja e com a TRIP na mão pude ver a tal lingueta em ação assim que acionei o disparador com ela devidamente tampada. Maravilha
, ela ficou muito bem acondicionada na gaveta de meu pai. Foi incrível sabê-la pronta para mais um teste, esse para ter certeza de que ficou tudo bem. E comecei a fotografar no modo automático (A), porque, sem o fotômetro de mão, eu teria de usar a tabela do filme, recurso, em princípio, menos exato. Não quis arriscar, afinal em serviços de conserto de câmeras usadas a garantia é de apenas três meses. E, funcionando bem no automático, claro, o fotômetro seria testado!
Então me pus a fotografar com ela e, numa saída fotográfica solo, levando não só ela como a Canon, aconteceu de o filme da Canon acabar e eu recorrer à TRIP quando passava por uns galpões antigos 


Luz no escuro_Marga Ledora_2010Luz no escuro, 2010

A foto é escura mesmo, a TRIP me fez essa surpresa de fotografar a cena apesar da pouca luz. O fotômetro funciona!
Ela está pronta, quero muita luz passando por sua bela lente.
 
As células de selênio vivem8.


_______
* Hoje é 24 de julho mas a data que estão vendo é a de quando quase foi publicada a postagem, que na verdade foi iniciada bem antes mesmo.
Acontece que fui contando coisas e mais coisas e senti necessidade de explicar outras tantas e, claro, acabei tendo de adiar. 
As notas são mais para quem tem interesse em informações de caráter técnico, quem não tiver esse interesse fique à vontade para ignorar ignorar.


1. Fotografia é uma arte cheia de características que precisamos de fato aprender, prestar atenção e pensar porque é bastante diferente de pegar uma câmera e sair mirando isso e aquilo e apertando o botãozinho disparador. Isso pode até ser válido se estamos com câmeras que só funcionam no automático.
Quando acionamos o disparador, o diafragma fica aberto por um tempo para captar a imagem no filme. Na TRIP esse tempo é , no modo automático, de 1/40 ou 1/200 segundo  e no manual  1/40 segundo. Não podemos regular o tempo de exposição como em câmeras Reflex, sejam analógicas (SLR) ou digitais (DSLR).
O que descrevi há pouco no texto sobre as aberturas não dá para ser seguido como uma norma fixa, vale para algumas situações e depende dos recursos da câmera usada. Por exemplo em fotografia noturna, o diafragma com abertura pequena fica aberto para um tempo maior de exposição à cena em câmera que tem um recurso de tempo chamado Modo B. Numa câmera como a Canon que uso, dois segundos é o tempo máximo que a câmera mantém o diafragma aberto, digamos, sem precisar de mais nehuma recurso. O Modo B é usado para tempos de exposição do filme acima desse de 2s, podendo-se manter o diafragma aberto por horas a fio, desde que se disponha de um tripé, para evitar trepidação da máquina que produziria foto fora de foco. Cabo disparador, a ser acoplado ao botão disparador da câmera, também é um acessório importante

s_MLB_v_O_f_153297296_8615
ainda mais se possuir um dispositivo que o trava para ficar p
ressionando o botão pelo tempo escolhido pelo fotógrafo.
Não sei ainda de se há alguma câmera com dispositivo interno para longas exposições desse tipo em modo B, que nos dispense de tomar conta da hora com um relógio. Fotos onde há carros em movimento são feitas com longas exposições

 


2. O fotômetro serve para medir a luz que atravessa a lente da câmera e vai incidir sobre o filme quando acionamos o botão disparador e o filme é exposto à cena que desejamos fotografar. Essa medição vai determinar qual a abertura de diafragma adequada para a exposição correta do filme e obtermos uma boa fotografia. Há fotômetro interno à câmera, como no caso das câmeras que uso,  e o de mão.
3. No modo A, é o fotômetro da TRIP que controla essas aberturas de acordo com a luminosidade entrando pela lente. No modo manual, o fotômetro dela não funciona. Com a experiência o fotógrafo pode adquirir a capacidade de decidir sobre as aberturas e conseguir, digamos, fazer um pouco o papel de fotômetro. Em outros tipos de câmera, o fotômetro funciona no modo manual também, na Canon AE-1 PROGRAM é assim.
O fotômetro de mão é o mais preciso, dizem, porque você vai com ele até o objeto, aproxima e mede a luz emitida por esse objeto ou pessoa, assim o aparelho determina a abertura ideal. Digo ideal porque o fotógrafo pode decidir usar ou não esse número, caso queira um efeito ou outro na fotografia. O fator experiência do fotógrafo não pode ser desprezado.

A luz medida pelos fotômetros é a refletida pelo objeto, isso leva um tempo para explicar, mas vejam a figura

Luz refletida pelo objeto Luz refletida pelo objeto  

4. Sim, as células de selênio morrem com exposição ininterrupta à luz, por isso a TRIP tem de ser guardada com a lente tampada e no estojo; é a maneira de proteger as células, preservando sua capacidade de identificar a luminosidade da cena.
5. Não editei as fotos, apenas ditalizei, o que já alterou um pouco as iamgens. Afinal, os olhos do escâner tem lá suas características e limitações, como os nossos olhos também têm.
6. Não sei qual meu nível de conhecimento sobre câmeras atualmente, mas o que sei é que é essencial ter um conhecimento mínimo, aprender com leitura, em cursos, sites, em conversas com quem tem experiência, sejam amigos, professores, profissionais e especialmente com o pessoal das lojas onde encontramos materiais fotográficos. Há sempre um deles com vontade de nos contar isso e aquilo sobre câmera, como fotografar também. Tenho tido o privilégio de ouvir deles todos informações que me ajudaram até mesmo avaliar lentes de câmeras, algo impensável há um ano, pois não sabia nada a respeito de equipamentos fotográficos e de como fotografar de verdade e sobre cuidados com o equipamento.
7. Para verificar isso, com a câmera sem filme, a gente olha para a lente e nota se o diafragma se abre quando o botão disparador é acionado. Não se movia, a abertura permanecia sempre com o mesmo diâmetro, não importando se decidisse por f2.8 quanto por f22. Travou numa determinada abertura por falta de uso, de limpeza e lubrificação.

8. O fotômetro não dá para dizer que foi consertado, não foi. Se as células não estivessem vivas, somente encontrando uma câmera TRIP que estivesse com outros problemas menos no fotômetro para retirar dela e colocar na minha. A Olympus TRIP 35 é adorada por muitos, li depoimento de fotógrafo que sai de loja em loja atrás de peças usadas, pois não se fabricam mais essas (e outras) câmeras,  para colocá-las em uso. Uma dica para quem se interessar em ter uma, há muitas em lojas de materiais fotográficos usados, e, se puder escolher, procure comprar TRIP com tampa para ter uma chance de o fotômetro funcionar. São câmeras baratas e com uma lente de primeira, a D. Zuiko. O teste da lingueta ajuda bastante na hora de decidir sobre o funcionamento do fotômetro mas não é tudo, um técnico competente é quem vai dizer como está a câmera.
A TRIP eu levei na Tema Técnica, aqui mesmo em Campinas (SP). Não  conhecia nem me foi recomendada por ninguém conhecido meu. Decidi levar lá por ver que havia donos de câmeras de outros lugares do país enviando para essa loja e satisfeitos. Também estou, valeu esperar pelo seviço. Em São Paulo e outros lugares no país têm técnicos especializados em conserto de câmeras analógicas para o alívio e alegria de muitos. É um incentivo para continuarmos fotografando com essas câmeras maravilhosas.